Page 23 - Diretrizes para Produção Textual - 2ª Edição
P. 23

2.4. Variação linguística e registro
          É preciso ter em mente que as línguas são heterogêneas por natureza, tais como organismos
          vivos sofrem influência do ambiente e influenciam o ambiente em que circulam. Assim, a
          variação é um fenômeno inerente às línguas e ocorre devido a fatores sociais, temporais, gera-
          cionais, geográficos e situacionais que se sobrepõem e atuam em âmbito individual e coletivo.
          O português, como chamamos a língua materna da maioria dos brasileiros, é, na verdade, a
          reunião de vários falares, um conjunto de variedades, tomadas como as diferentes manifesta-
          ções de uma mesma língua. No âmbito coletivo, a variedade representa um grupo de indivíduos
          que se identificam por um jeito específico de falar ou escrever, como no caso das gírias, dos so-
          taques e dos regionalismos. No âmbito individual, o mesmo usuário da língua varia a linguagem
          de acordo com quem está falando ou para quem escreve, adequando-se à situação comunicati-
          va. Desse modo, temos situações em que se exige maior ou menor grau de formalismo no uso da
          língua, ao qual chamamos de registro.
          Entre as variantes da língua, uma é escolhida para fins de ensino e padronização em publica-
          ções e comunicação oficial, conhecida como norma-padrão. Cabe ressaltar que não existe hie-
          rarquia entre as variantes e não cabe julgamento de valor de nenhuma espécie. Embora a nor-
          ma-padrão seja comumente identificada como a forma certa de falar/escrever, isso é um mito
          que não se sustenta diante da diversidade e da variação da língua. É importante não incentivar
          o preconceito linguístico, considerando que o prestígio de uma determinada variante expressa
          o prestígio de seus falantes, e não o valor. Não é possível ler e escrever de uma mesma maneira
          em todas as situações. É preciso fazer adequações, conhecer e dominar a norma-padrão e as
          outras variedades.
          Em relação ao ensino da variação linguística, a BNCC salienta:
                      Ainda que continue em jogo a aprendizagem da norma-padrão, em função
                      de situações e gêneros que a requeiram, outras variedades devem ter espaço
                      e devem ser legitimadas. A perspectiva de abordagem do português brasileiro
                      também deve estar presente, assim como a reflexão sobre as razões de sua ainda
                      pouca presença nos materiais didáticos e nas escolas brasileiras. (BRASIL, p. 504).
          A concepção de análise e reflexão linguística/semiótica, adotada desde os PCNs (Parâmetros
          Curriculares Nacionais), em substituição ao ensino tradicional de gramática, inova ao propor
          um ensino de língua materna voltado para a investigação dos fenômenos da língua em uso e
          para a produção de sentidos decorrentes da interação entre os diferentes sistemas de signos.
          Portanto, o falso dilema entre ensinar ou não gramática encontra-se superado, uma vez
          que já não cabe um ensino de língua materna em que se ensina como deve ser a língua, mas,
          sim, como a língua é, como funciona e quais são suas possibilidades. Nessa perspectiva de
          educação linguística, a gramática não é um fim em si mesmo, nem as análises são descontex-
          tualizadas do uso. Superado o paradigma prescritivo tradicional da definição, classificação e
          exercitação/fixação, assume lugar o paradigma descritivo da observação, discussão, reflexão
          e análise de dados reais da língua, a fim de proceder à generalização e à sistematização dos
          conhecimentos linguísticos.



                                           Diretrizes para Producao Textual - 2   Edição  23
                                                                 a
   18   19   20   21   22   23   24   25   26   27   28