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Portanto, fala e escrita não são correspondentes nem espelhamentos uma da outra, como equi-
vocadamente circula no senso comum. A escrita não é uma tentativa de representação da fala,
mas antes uma forma autônoma de organizar os pensamentos e o discurso e de interagir na vida
social. Fala e escrita são duas manifestações legítimas e complementares do sistema linguísti-
co (língua), cada uma com recursos próprios de expressão. A fala conta com elementos sonoros,
prosódia, entonação e com elementos não verbais, tais como expressões faciais e gestos corpo-
rais. Por seu turno, a escrita lança mão de um sistema alfabético, de indicativos gráficos, como
pontuação e acentuação, além de outros elementos visuais, como cores, formas e tamanhos.
A fala antecede a escrita, é natural e, mesmo nas sociedades altamente letradas, mais utiliza-
da nas interações; enquanto a escrita é um artifício culturalmente desenvolvido e carece de
aprendizagem formal para o seu pleno uso. Contudo, fala e escrita não chegam a formar uma
dicotomia. Elas são um continuum gradativo, considerando que não há domínios ou eventos
exclusivos de cada uma dessas representações. Destacamos a fala do mestre Marcuschi (2010)
para elucidar essa afirmação: “Um dos aspectos centrais nesta questão é a impossibilidade de
situar oralidade e a escrita em sistemas linguísticos diversos, de modo que ambas fazem parte
do mesmo sistema da língua.”.
Comumente, a fala está relacionada a situações espontâneas e não planejadas, mas há situ-
ações de escrita que também o são. A escrita é normalmente associada à norma-padrão, mas
há situações de letramento e eventos de fala que também exigem esse registro. Tem-se a falsa
impressão de que a escrita é homogênea e não permite variações, mas isso também depende do
gênero textual. Embora a escrita seja socialmente mais prestigiada, a fala também merece
prestígio. A fala é carregada pelas marcas do indivíduo, pois está imersa em uma situacionali-
dade inerente (aqui e agora), enquanto a escrita permite um maior distanciamento do emissor
no tempo e no espaço, embora, mesmo na escrita, seja possível identificar traços particulares
do emissor, aos quais chamamos de estilo. São os gêneros textuais – realização concreta da
língua – que vão indicar se determinada prática está situada no âmbito da oralidade ou
do letramento. Assim, os gêneros exibem características híbridas com relação ao meio de
produção e ao modo como são concebidos. Por isso, não é produtiva uma abordagem que separe
gêneros da fala e gêneros da escrita. Vejamos o quadro a seguir, sobre a comparação entre os
gêneros e como eles agregam características das duas modalidades:
Figura 8 – Intersecção das modalidades nos gêneros textuais
Meio de produção Concepção discursiva
Gênero textual
Sonoro Gráfico Oral Escrita
Conversação espontânea X X
Artigo científico X X
Notícia de TV X X
Entrevista pública na Veja X X
Adaptado de Marcuschi (2010)
Finalmente, a multimodalidade refere-se à combinação entre modalidades (fala e escrita) e à
presença de diferentes signos num mesmo gênero textual. Na contemporaneidade, a
multimodalidade foi incorporada pelas diferentes mídias e é cada vez mais presente nos gêneros
digitais.
a
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