Ir. Wagner Cruz – Foto: arquivo pessoal

                                              Calistemo, criativo e inovador

Desde muito cedo, Ir. Wagner Cruz já se interessava pela vida religiosa e eclesial. Com apenas 10 anos, ingressou em um grupo de adolescentes; dois anos depois – aos 12 anos – já fazia parte do grupo de jovens e, com 14 anos, era o líder deste grupo. Com 17 anos, já era coordenador de diocese. Toda esta precocidade sempre esteve aliada ao apoio familiar, que, invariavelmente, apoiou as “causas” do filho mais novo, de uma prole de quatro descendentes.

Já jovem, integrou na Pastoral da Juventude (PJ), no qual vivenciou momentos “bonitos e memoráveis”, ao organizar a primeira Romaria Estadual da Juventude, na Baixada Fluminense, em Nova Iguaçu. Em seguida, foi para a universidade, e concluiu a graduação e a especialização, antes de entrar para o Instituto Marista, aos 22 anos – mais uma vez, utilizou da extemporaneidade! Para chegar à Congregação, e tomar a decisão de fazer parte do Instituto, o Irmão passou por alguns episódios, no mínimo interessantes, que você pode acompanhar nas respostas à entrevista, mas especificamente, à pergunta de número três.

Hoje, como vice-presidente das mantenedoras UBEE-UNBEC, e depois de uma trajetória variada de cargos e áreas no Instituto Marista, afirma que “tudo tem um propósito, precisamos viver com muita responsabilidade, dignidade, esperança e, também, com muita leveza”. Para conhecer a história deste Irmão precoce, criativo e vivaz, leia a entrevista abaixo, e experimente uma obra cheia de alegria, jovialidade, gratidão e fé!

 

 

1) Ir. Wagner, desde cedo o senhor esteve ligado às questões religiosas e eclesiais, influenciado pela família e por amigos mais próximos. Com apenas 10 anos, o senhor já ingressava no grupo Perseverança – um grupo de adolescentes preparatório para o grupo de jovens. E daí em diante, a sua caminhada se tornava cada vez mais próxima da vida religiosa. Pode nos contar um pouco desta trajetória? Como isso aconteceu em sua vida?

Nasci em uma família na qual há pessoas de outros credos e religiões, em cujo núcleo sempre houve o respeito pela diversidade religiosa. Cresci em meio a estas diferenças, dialogando com estas pessoas. Minha família é muito católica, meus pais, por exemplo, sempre estiveram à frente de grandes momentos da Diocese de Barra do Piraí – Volta Redonda (RJ), e da paróquia, em Resende (RJ), cidade em que nasci.

Foi em Resende que aprendi, com meus pais, desde criança, a olhar pelo bem-comum. Meus pais eram funcionários públicos, e juntos coordenavam a Pastoral Familiar e o Encontro de Casais com Cristo. Minha mãe sempre se dedicou à assistência social, sobretudo aos menos favorecidos. Meu pai, por sua vez, sempre deu suporte à paróquia na área de gestão e na mobilização de recursos para a construção das comunidades.

Meus pais ainda coordenaram por muitos anos o Conselho Pastoral da Paróquia Nossa Senhora da Conceição, da qual eu participava, e o regional diocesano. Neste ambiente, ainda na catequese, dei meus primeiros passos de liderança, ao estudar os valores religiosos, bem próximos aos valores que, mais tarde, encontraria na educação marista. Nesta época, ajudava a catequista, e logo tivemos um diálogo sobre minha participação no Perseverança – um grupo de adolescentes preparatório para o grupo de jovens. Tinha quase 10 anos e, como tudo sempre aconteceu precocemente em minha vida, queria participar logo deste grupo. Queria ir além da catequese, e o Perseverança era o caminho contínuo que eu vislumbrava. E, depois de um diálogo entre o padre e os catequistas, lá estava eu, no grupo Perseverança. Assim começou a minha trajetória na vida religiosa.

2) Depois deste primeiro período, o senhor entrou para a militância, na Pastoral da Juventude, onde ficou até se tornar Irmão Marista, certo? Como foi este tempo na Pastoral da Juventude, além de outros trabalhos que o senhor exerceu com, e para, os jovens?

Depois do grupo Perseverança (pré-juvenil), ingressei no grupo de jovens com 12 anos, e aos 14, eu já liderava este grupo. Com 17 anos, eu já estava na coordenação diocesana. Este rápido processo se deu porque, ainda bem jovem, comecei uma trajetória na formação bíblica e em outras áreas, no contexto das comunidades eclesiais de base. Existia, por exemplo, uma formação na diocese, que era o Curso de Verão, e eu, com 13 anos, fui participar. Foram quatro anos de estudo, numa sequência de aprofundamentos bíblicos, de cidadania, de formação integral, na linha da Pastoral da Juventude (PJ).

Foi na PJ que organizamos momentos bonitos e memoráveis. O ano de 1994, por exemplo, foi o que a “memória amou e ficou eterno”. Naquela ocasião, organizamos a primeira Romaria Estadual da Juventude, na Baixada Fluminense, em Nova Iguaçu (RJ). Tínhamos a expectativa de reunir 5 mil jovens, porém o nosso sonho cresceu, e levamos 17 mil jovens para o evento. Até hoje a preparação dessa Romaria mexe comigo, pois se tornou a síntese da minha trajetória com a Igreja de Volta Redonda.

Depois deste tempo memorável, ingressei na universidade. Durante a formação universitária, coordenava parte da catequese, participava de espaços como assessor da PJ, e trabalhava numa escola pública, num bairro onde as Irmãs Salesianas também trabalhavam, chamado Cidade da Alegria. Eram tempos de muitas tarefas, e eu ainda aproveitava para trabalhar em uma ótica, a fim de buscar minha autonomia financeira e ser independente dos recursos de minha família.

Estas experiências, de certo modo, precoces, me possibilitaram ver o mundo e a família de modo diferente. Com isso, obtive um jeito e uma concepção de pensar escola, jovens e evangelização de forma muito própria. A essência do que sou hoje, adveio da Pastoral da Juventude, da experiência de militância eclesial e civil.

3) Aos 22 anos, o senhor entrou para a Congregação, após o término da universidade. Conte-nos um pouco desta caminhada até chegar aos Irmãos Maristas: teve fogueira de livros queimada, vocação que nasceu da mentira de uma freira, a muda de calistemo (rs) … nos fale um pouco destes episódios que, “no fundo”, lhe encaminharam para entrar no Instituto Marista.

Apesar de amar a administração dos sacramentos, eu achava que não daria conta de ficar vinculado a estes processos. Mas, mesmo assim, as influências me cercavam, eu já conhecia os Irmãos Maristas, que trabalhavam na Baixada Fluminense, e admirava o trabalho e o compromisso deles. Ao mesmo tempo, eu achava que a vida religiosa era para pessoas queridas, admiradas e muito harmonizadas. Eu pensava “não sei se este negócio vai dar certo pra mim”. Comecei, então, a partilhar um pouco destes questionamentos pessoais com as Irmãs Missionárias da Pastoral Diocesana, um instituto religioso fundado em Torréon, no México. Foram elas que começaram a me dizer “você tem tudo de Marista. Achamos que o jeito Marista é um jeito interessante e você vai gostar”. Eu apenas ria.

É neste momento que começam as “aventuras” citadas na pergunta. Em um encontro, que eu estava participando em Mendes (RJ), a Ir. Candelária Lopes disse ao Ir. Hugo Dewes que eu era um excelente jovem na comunidade, e que eu “daria” um ótimo Marista. Desta forma, Ir. Hugo trouxe uma “pilha” de materiais vocacionais para eu ler, e disse que iria fazer o acompanhamento. Quando cheguei em casa, fiz uma fogueira e queimei quase tudo – só sobraram dois livros, pois pensei que poderia ter neles algum trabalho, praticamente, pronto para a universidade. Aí eu li, e vejam onde estou! (rs)

Por isso, brinco que a minha vocação nasceu da mentira de uma freira – Ir. Candelária. Não sei se ela vai pro céu, mas sinto que foi ungida para me dar a força de tomar a decisão que talvez, eu sozinho, não tivesse coragem de tomar. O Ir. Hugo Dewes também foi determinante na minha vocação – este homem conversava comigo quase que semanalmente, trocávamos cartas e quando eu ia a Mendes, ele me acompanhava e catequizava.

Ir. Hugo evangelizava a partir das plantas e das flores que cultivava. Quando estava prestes a morrer, eu já sendo noviço, ele me deu uma muda de calistemo. E disse: “Esta muda que estou lhe dando, você plantará em Campinas (SP). Um dia eu vou embora daqui, e você bem sabe disso – e este dia não está longe. Após minha partida, quando você voltar aqui, ainda vai se sentar embaixo deste calistemo, em frente a nossa casa, e, à sombra desta árvore, vai meditar para entender a minha chegada e a minha partida”. E foi assim que aconteceu: fui para Campinas e plantei a árvore; quando voltei a Mendes, fiz o que ele disse. O calistemo cresce, floresce, frutifica e morre, e depois cresce de novo, floresce, frutifica e morre. Assim, entendi a escatologia da vida. E foi com estes episódios que ingressei no Instituto Marista aos 22 anos!

4) No Instituto Marista, o senhor já foi professor, assessor da Pastoral da Juventude, diretor do Centro Marista de Juventude (CMJ), orientador educacional, coordenador do Ensino Médio, diretor de Colégio, conselheiro provincial, e ajudou no nascimento da União Marista do Brasil (UMBRASIL) – sendo o primeiro secretário-executivo da UMBRASIL e, posteriormente, o seu presidente. Atualmente, o senhor é diretor vice-presidente das mantenedoras Educação Brasileira de Educação e Ensino (UBEE) e União Norte Brasileira de Educação e Cultura (UNBEC), e também membro do Comitê Regional da América Sul. Como foi trilhar um caminho com tantas e, importantes, funções dentro do Instituto? O que este caminho lhe trouxe?

Cresci muito com todas estas experiências, aprendendo com e em diversos lugares. Estou há, mais ou menos, 12 anos na gestão e, neste período, ajudei no nascimento da UMBRASIL, depois em seu acompanhamento como secretário-executivo, e como presidente dela. Agora, pela segunda vez, estou na dinâmica do acompanhamento das mantenedoras (entidades civis que mantêm os colégios e demais obras maristas). Neste tempo, muita “coisa” mudou, as estruturas mudaram, e eu também mudei. Porém, os princípios e a epistemologia da minha vida e da minha vocação são os mesmos.

O Wagner de outrora é o mesmo de agora! Com todo este caminho percorrido, pessoal e profissional, vejo-me hoje, como sempre fui: alegre, sonhador, crítico, intenso, verdadeiro, disposto a enfrentar, de forma corajosa, os desafios que a vida impõe. Sou alguém que não se estabiliza e nem se cristaliza. Acredito que a nossa vida tem que ter dinamismo, tem que ter diversidade.

O Instituto Marista, do qual me orgulho em fazer parte, existe para também dar dignidade às crianças e aos jovens. Sinto que nossa vocação é para algo grande, para uma missão que só se cumprirá se formos capazes de pensar além, de incluir mais, de amar mais, de sermos mais capazes de fazer o bem na vida de todo o mundo. Sou muito feliz e agradecido por tudo que vivi até aqui – profissional e pessoal. A gratidão é o pão que tem me alimentado e que tento retribuir na fraternidade com os Irmãos. Ainda espero mais da vida, dos jovens, da instituição, de mim mesmo. Por isso, ESTOU AQUI.

5) Percebe-se, em sua trajetória, que o senhor sempre procurou estar perto do jovem, da juventude. O seu jeito de ser Irmão, também reflete um jeito jovem de ser, pensar, estar e atuar. Nos conte, Irmão: o segredo é levar a juventude no coração para lidar com a vida pessoal, profissional e consagrada?

Este é o meu jeito de ser Irmão, caracterizado pela maneira como fui jovem, décadas atrás. O amor pelo Evangelho, pelo diálogo inter-religioso, pelas religiões, tudo reverbera nas exigências quanto ao modo com que devo me colocar no mundo. É claro, sei que sou uma pessoa intensa e exigente, assim como o Evangelho é intenso e exigente. Isso tudo contribui para se ter métrica, para balizar a avaliação do projeto de vida. Acredito que no dia em que deixar de ser exigente, deixarei também de ser Wagner, e no dia em que eu deixar de querer que o outro seja escutado, também vou deixar de ser eu. Não posso ver a exclusão juvenil e achar natural, porque na formação da minha identidade aprendi a incluir o jovem, e não a exclui-lo.

Estive à frente da Conferência dos Religiosos do Brasil (CRB) – Regional Brasília (DF), por oito anos, e também atuei em outras congregações, que não o Marista. Em todas estas passagens, aprendi que, na profecia itinerante e na história do povo de Deus, não fazemos nada sozinhos; somos, inclusive, com a nossa consagração, resposta de Deus aos apelos da humanidade e aos jovens contemporâneos.

Vivemos muitas coisas na vida, e se olharmos para a história de cada um, percebemos que tudo que aconteceu teve um propósito maior. A vida é mistério, é dádiva. Precisamos viver tudo com muita responsabilidade, dignidade e esperança. E também com a leveza de um jovem, que sonha com um mundo melhor, e carrega em seu coração expectativas e perspectivas para deixar o planeta terra um ambiente saudável para as gerações que virão por aí!

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2 Comments
  1. Walmir Xavier

    Caro Ir.Wagner.
    Alegro-me em poder ler um pouco de sua história, a qual desconhecia alguns pontos.
    Parabéns pelo belo trabalho que realizou e realiza nestes “caminhos da vida”.
    Uma Santa Páscoa para você, com saúde e muita Luz.
    Fraterno Abraço.
    Walmir.

  2. Grande, Ir. Wagner

    Que bela história.
    Como tem passado? Saudades dos meus tempos de Marista. Boas, inteligentes e produtivas eram as atividades em que, com alguma frequência, nos encontrávamos pela Província.
    Me lembro como se fosse ontem que você me pediu para gravar a bela celebração dos seus votos perpétuos na Capela de Mendes. Espero que ainda tenha esse registro. Para mim foi uma grande alegria e honra ter participado daquele momento tão especial da sua vida.
    Mande notícias.
    Abraços do velho amigo carioca, Cadu Dias Lopes.

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