O Ir. Paulo Soares, coordenador de Evangelização, da Superintendência de Missão, da Província Marista Brasil Centro-Norte (PMBCN), escreveu um artigo em celebração aos 500 anos da Reforma Protestante, protagonizada por Martin Lutero. Para ele, a Reforma não é apenas um fato histórico importante na efemérides cristã-católica, mas também um “tema” para reflexão.

“Em 1517, no dia 31 de outubro, o monge agostiniano Martim Lutero publicou um texto com as suas 95 teses sobre distintos posicionamentos eclesiais e teológicos. O fato é que as inquietações de Lutero provocam em cada um de nós um movimento de constante reforma da nossa interioridade, estruturas e modos de fazer pastoral”, afirmou.

Apreciem o artigo e boa reflexão!

Ir. Paulo Soares

Ir. Paulo Soares, coordenador de Evangelização, da Província Brasil Centro Norte (Foto: Cristiano Giamarco)

 

(Re) formar, um verbo que nos desinstala

                                                                                         Ir. Paulo Soares, fms

Quando falamos em reformar, é impossível não nos remetermos à imagem das nossas casas, das tantas reformas que empreendemos por distintas razões. O nascimento de um filho, a acessibilidade para um parente enfermo, as festas de natal e ano novo são alguns dos motivos que nos mobilizam a realizar pequenos ou grandes reparos em nossos lares. Podemos considerar que a reforma pode provocar em nós dois movimentos, interior e exterior.

Reformar apenas o exterior pode dar uma impressão de falseamento da realidade, se muda a fachada, mas se permanece o mesmo por dentro. Outro modo de reformar é começar pelo interior, desde dentro; do quarto, lugar da intimidade e do descanso; da sala, lugar do convívio e da interação; da cozinha lugar da comunhão. Olhando para essa dinâmica de reforma podemos perceber que a ordem não é o mais importante, mas significa que precisamos reformar nossa fachada e nossa interioridade. Se começamos por fora, devemos fazer em direção à nossa interioridade e se começamos pelo que há de mais interno em cada um de nós, devemos ter a capacidade de revelar a beleza do que realizamos dentro.

O verbo reformar nos desinstala da rigidez do concreto e nos coloca num movimento de constante renovação. Talvez seja o mesmo espírito que moveu Martin Lutero há 500 anos, quando publicou suas 95 teses que mudaram definitivamente a história da Igreja.

É interessante notar que algumas mudanças só acontecem em nossas vidas quando somos interpelados por algo ou alguém. Isso significa que não mudamos apenas voluntariamente, mas muitas vezes reativamente. Reagimos à situações, posturas, criatividade, infidelidade, ao amor, ódio, às alegrias, ao tempo presente e ao passado em vista de um futuro. Frente a isso, nesta celebração dos 500 anos da Reforma Protestante fico pensando nas mudanças que somos interpelados a fazer para continuar preservando nossa missão educativa e evangelizadora. Apresento alguns apelos contemporâneos que nos desinstalam enquanto educadores e pastoralistas.

1. Uma Pastoral Educativa capaz de se (re)pensar: esticar os horizontes, conseguir perceber quais os discursos de Deus manifestados na boca e na postura das infâncias e juventudes. Repensar a epistemologia que compõe nossa ação pastoral, nosso modo de compreender a realidade, as imagens de Deus, de ser humano e de mundo.

2. Uma Pastoral Educativa capaz de se (re)fazer: com abertura para redesenhar seus esquemas, de vincular a pedagogia com a evangelização, por meio da construção de planos estratégicos que revelem nosso posicionamento de atuação com os diferentes com quem interagimos.

3. Uma Pastoral Educativa capaz de se (re)formar: implica realizar os dois movimentos de interioridade e exterioridade, transformar de fora para dentro e de dentro para fora. Aqui nos deparamos com a exigência de uma nova linguagem, roupagem, imagem e simbologia para transmitir com qualidade os conteúdos da fé. Nos provoca também a reorganizar o interior das nossas equipes de pastoral, pensar na qualidade do tempo que dedicamos à oração, aos estudos e à relação entre pares e com os demais.

A celebração da Reforma Protestante é um marco histórico que não nos prende a um passado, mas se contemporiza na medida em que nos colocamos em constante movimento de transformação das nossas estruturas. Mudar e reformar faz parte da dinâmica humana e não poderia se dar de maneira distinta nas instituições que são criadas para reorganizar o modo de vida.

Em recente visita à Colômbia, o Papa Francisco ressaltou que entre as atitudes do discípulo está a capacidade de renovar-se. Isso “não nos deve meter medo, pois a Igreja está sempre em renovação (Ecclesia sempre reformanda) vive um constante movimento de reforma”. Vale destacar que não somos os arquitetos dessa reforma, mas é o próprio Espírito que age em cada um de nós, inspirando-nos a criatividade e ao que é bom, belo e verdadeiro.

É uma feliz coincidência que no ano em que celebramos o bicentenário do Instituto Marista, sejamos marcados pelos 500 anos da Reforma e ao mesmo tempo somos motivados a viver “um novo começo” pelo XXII Capítulo Geral. Vamos nos valer das palavras do cordelista Bráulio Bessa para mergulhar ainda mais na dinâmica do reformar-se:

Recomeço

Quando a vida bater forte e sua alma sangrar,
quando esse mundo pesado lhe ferir, lhe esmagar,
é hora do recomeço, recomece a lutar.

Quando tudo for escuro e nada iluminar,
quando tudo for incerto e você só duvidar,
é hora do recomeço, recomece a acertar.

Quando a estrada for longa e seu corpo fraquejar,
quando não houver caminho, nenhum lugar para chegar,
é hora do recomeço, recomece a caminhar.

Quando o mal for evidente e o amor ocultar,
quando o peito for vazio e o abraço faltar,
é hora do recomeço, recomece a amar.

Quando você cair e ninguém lhe aparar,
quando a força do que é ruim lhe derrubar,
é hora do recomeço, recomece a levantar.

Quando a falta de esperança lhe açoitar,
se tudo que for real for difícil suportar,
mais uma vez é hora de recomeçar, recomece a sonhar.

Enfim meu povo. É preciso de um final para poder recomeçar.
Como é preciso cair para poder se levantar.

Nem sempre engatar a significa voltar.
Remarque aquele encontro, reconquiste um amor, reúna quem lhe quer bem.

Reconforte um sofredor, reanime quem está triste, reaprenda na dor.

Recomece, se esforce, relembre o que foi bom, reconstrua cada sonho,
redescubra algum dom, reaprenda quando errar,
rebole quando dançar.

E se um dia lá na frente a vida der uma ,
recupere sua fé e recomece novamente.

A memória da Reforma Protestante não é uma mera lembrança, mas nos provoca a um exercício de presente e de futuro.
Vamos reformar nossa vida e nossas estruturas?

 

 

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