Meu nome é Maria Goretti das Neves Vieira Machado, natural de Salvador (BA), casada e mãe de dois meninos. Educadora há mais de 30 anos, comecei minha vida profissional aos 17 anos, no Colégio Marista Nossa Senhora da Vitória. Neste momento, iniciei minha trajetória nesta Instituição, que aos poucos fui conhecendo e me revelando; por causa deste encontro, estamos juntos até hoje.
Há cinco anos, fui transferida de Salvador para Colatina, cidade do noroeste do Espírito Santo, para assumir a diretoria do Colégio, que faz presença, nessas terras, há 64 anos.
No início, uma mistura de alegria e tristeza. Alegria por ser desafiada, como profissional, a atuar numa nova realidade e fazer acontecer a missão marista com competência e responsabilidade. Tristeza, porque iria traçar um novo tipo de caminho, iria sem minha família, pois eles preferiram ficar em Salvador, onde estavam bem e com seus rumos traçados, pessoal e profissional. Foi desafiador, mas neste momento percebi o quanto fui para eles presença marcante de esposa e mãe. Recebi deles todo o apoio e incentivo para seguir em frente fazendo o que amo.
Ao chegar em Colatina, fui muito bem acolhida pela Comunidade Religiosa, que na época eram os Irmãos Antônio Gava e Carlos Henrique. Ficaria com eles por um tempo, até encontrar um lugar para morar. E durante quatro meses, começamos a conviver, partilhando o mesmo espaço. Confesso que a adaptação foi muito tranquila, um clima de muito respeito e amizade brotava a cada dia.
Após esse período, consegui um lugar próximo à Comunidade e anunciei aos Irmãos que, após as férias, me mudaria. Eis que as férias chegaram e pude rever a minha família, descansar. Ao retornar, fui recebida com flores e um cartão que dizia que “minha presença fez falta e que agora eu não era mais uma hóspede e sim membro da Comunidade”.
A emoção foi forte, tocou meu ser e aí fui saber como seria possível. O Ir. Antônio Gava me disse que havia conversado com o Provincial e com os Irmãos Luizinho e Arnaldo Sousa, que viriam fazer parte da Comunidade. O Provincial autorizou, e os Irmãos acolheram com alegria. Desse dia em diante começava a nascer uma experiência que surgia por um gesto simples de bem querer e ia se configurando em partilha de vida.
Hoje, posso dar o meu testemunho, como leiga, de que é possível vivermos juntos, como fraternidade, reconhecendo que não é simples e nem é para todos. O espírito de família é o primeiro componente que fortalece a experiência, pois nele habita o respeito, o diálogo, a abertura ao novo, o compromisso, a corresponsabilidade e o saber escutar e acolher as diferenças. Viver em comunidade é, acima de tudo, viver o amor trinitário. Compreender que formamos o Corpo de Cristo, que somos Igreja, família, que testemunha o evangelho, no seu dia a dia, aprofundando o sentido de fraternidade, de dedicação e de serviço.
Viver em uma comunidade “mista” é rememorar a visitação de Maria, ou seja, sair do lugar comum e partir em direção ao outro, com alegria, não só para servir, mas para acolher a experiência do outro, que faz vibrar em nós a presença de Cristo.
A oportunidade de partilhar a vida com homens consagrados, e perceber que não precisamos perder nossa identidade, é algo muito especial. O nosso convívio é alimentado pela cordialidade, pela alegria, pelo envolvimento com a casa, pelos momentos de lazer, pela oração conjunta, pessoal, e pela Eucaristia – que sintetiza a importância desse alimento para nossa caminhada vocacional.
Essa experiência marca as nossas vidas, e fala de um novo modo de ser Comunidade. É uma experiência que ultrapassa os muros da nossa casa, chega até a Comunidade Educativa e até a Igreja local, com muita naturalidade, porque somos unidos, e expressamos um agir solidário, afetivo, com base nas “pequenas virtudes”, recomendada pelo nosso fundador São Marcelino.
Na minha vida pessoal, principalmente, essa experiência me transformou. Aprendi a importância do silêncio, tão necessário e que, muitas vezes, não somos capazes de fazer sozinhos. Aprendi a lidar com a solidão, que bate em nossa porta, e que fortalece o valor que o outro tem em nosso viver e que, mesmo não estando fisicamente, pode ser presença viva na lembrança. A solidão não é sentir-se sozinho, e sim estar mais próximo de Deus. Aprendi que quando vivemos a fraternidade, não há estranhamento. Somos como somos e essa grandeza de viver a simplicidade faz toda a diferença na nossa Comunidade. Aprendi a ser paciente, entender o tempo do outro. Aprendi a ouvir mais e a sentir o que, muitas vezes, é dito no silêncio. Aprendi o valor da confiança, tanto dos Irmãos para comigo, como do meu esposo e filhos.
Acredito que a minha presença também faz bem aos Irmãos, pois o feminino, entre nós traz: ternura, leveza, cuidado com os detalhes, carinho, atenção, colo, abraço, prontidão. O feminino é linha que une e faz tecer o linho. Procuro, em tudo, ser assim, para cada irmão, que são para mim, pessoas singulares, que aparam as minhas arestas e me fortalecem na caminhada. Há muito amor entre nós e, acima de tudo, um respeito mútuo.
Esta é uma experiência que pode ser o primeiro passo para esse novo começo, de Irmãos e leigos juntos, compartilhando a vida, na mesma missão. Viver em Comunidade é ter uma abertura de coração para viver com o outro, com o diferente; maturidade para não perdemos o sentido da nossa vocação e uma consciência plena de que somos itinerantes, missionários, possuímos asas e podemos voar, sem perdermos as nossas raízes e nem esquecermos do nosso ninho.
Maria Goretti Machado – diretora do Colégio Marista Colatina (ES)